Hospital

- Passas - menos nos últimos dias, pensei - Fizémos umas meias tréguas quando descobriste que ias ser mãe do meu filho. Decorámos um quarto para ele na minha casa e costumavas dormir lá muita vezes - aquela era uma parte muita breve da história.

- Haam.. - fiz uma cara de quem tinha percebido tudo o que ele estava para ali a dizer. Tentei pensar, pelo menos, tentar lembrar-me de tal coisa, mas nada.. Levantei-me devagar e apoei-me ao carro. - E nós ainda estamos nas tréguas?

Abri a porta de trás e pûs Vane na cadeirinha que instalara no carro. Verifiquei se ele estava segura três vezes e depois dei-me como satisfeito. Não queria saber como as coisas eram antes de ela não ter a amnésia. Vane estivera em perigo uma vez e não ia deixa voltar isso a acontecer, mesmo que isso significasse desagradar a "antiga" Alina - Temos um filho em comum, acho que é o mais decente de se fazer.

- Está bem Drake. - sorri levemente e tentei não me esquecer que o seu nome era mesmo Drake e que não o estava a confundir com um outro nome qualquer. Achava bem que fizessemos tréguas. Afinal, era rídiculo termos um filho e não nos darmos bem, acho..

e_e chama-lhe antiga, chama..

Abri-lhe a porta do carro e de seguida dei a volta e sentei-me no lado do condutor. Pûs a chave na ignição - Ainda bem.

Entrei no carro e sentei-me na cadeira, fechando logo de seguida, a porta. Depois coloquei o cinto, ou pelo menos tentei. Não fora assim tão díficil, oras.. - A minha casa é gira?

- Tu é que sabes. Acho que já pertence há tua família há uns bons anos - respondi, reunindo paciência para todas aquelas perguntas.

Achei por bem calar-me, já que percebia que começava a ser chata. Suspirei e encostei a minha cabeça à janela. - É, eu é que sei.. - revirei os olhos. Em poucos segundos, saímos dali.

Suspirei. Não me importava nada com o silêncio depois de dias turbulentos como estes. Arranquei o carro e segui até à sua casa.

- Claro que faria.. a toda a gente, neste caso! - Ainda andara meio que às voltas. Mesmo assim, lá cheguei ao hospital. Apressei-me a ir à recepção e logo me indicaram o andar em que devia subir. Seguidamente fui-me sentar numa cadeira.

Era preferível ignorar. Chegava a uma altura em que já nem tinha muita piada picá-la, Era sempre a mesma coisa.

Assim que chamaram o meu nome, peguei no bebé e segui caminho à sala indicada. Podia muito bem tê-lo deixado com Drake, mas não queria de maneira nenhuma, fazê-lo. Sentei-me na maca como pedido e coloquei o bebé, deitadinho na mesma. Aquilo passara rápido. Fora o mesmo médico que me atendera, depois de ter ficado amnésica. Fizera só uns exames, tirou-me o gesso do braço e receitou-me uns medicamentos. Depois voltei.

Fiquei cá fora. Nem tentei ouvir o que se passava dentro do consultório, não queria saber. Alina já não me dizia respeito e só a queria viva porque era a mãe do meu filho e queria que ele crescesse com uma mãe - Já estás pronta?

Com que então ele ainda estava ali. Pois que fosse, não queria saber mesmo. Ignorei-o por completo e fui ter com a recepcionista. Pedi-lhe algumas informações e seguidamente saí dali.

Aquela Alina era exasperante. mas não seria seu cachorrinho durante muito mais tempo. Segui atrás dela.

Abri os olhos e os sons começaram a despertar nos meus ouvidos. As máquinas, as portas, pessoas a gritarem e a dizerem que eu estava a acordar. Não conseguia ver muito bem, havia alguma coisa branca a dificultar-me a visão.
-Rapaz? - uma luz fez-me tentar afastar a cara e depois de tirarem uma ligadura da minha cara eu consegui ver na perfeição. - Consegue ouvir-me? - a mulher fez aquelas perguntas vezes e vezes sem contas até eu assentir.
-Sim - respondi olhando em volta sem me mexer muito, por alguma razão o meu corpo doía.
-Consegue dizer-me o seu nome - juntei as sobrancelhas voltando a vidrar o olhar na mulher e negar. Não, eu não sabia de nada.

- Como está a sua perna? - a enfermeira perguntou, como fazia todos os dias e eu apenas encolhi os ombros para lhe responder. Já tinha tinha estado pior mas continuava a doer, apesar de estar engessada.- mais tarde venho tratar-lhe dos outros pensos, está bem? - estava neste maldito hospital há três dias graças a alguém que eu nem sabia quem era. Quando estava a sair de casa, para ir ter com Audrey, a minha amiga e colega de trabalho, um carro chocou contra mim, vindo do nada. Do pouco que consegui ver, o condutor era pouco mais velho do que eu, mas devo dizer que o carro dele ficou mil vezes pior do que o meu. Ainda rodopiei durante demasiado tempo, mas quando o carro embateu numa árvore, tudo parou. Quanto a ferimentos tinha uma perna e duas costelas partidas e vários arranhões na cara, mas quase que podia adivinhar que nada se comparava aos ferimentos do outro condutor. Se bem que não estava muito preocupada, só gostava de saber quem era, pelo menos.- como está o outro rapaz? - acabei por perguntar, soltando um grito de dor quando me tocou no peito, na zona das costelas.
- O que entrou no mesmo dia que você? - assenti, respirando fundo.- creio que acordou à uns minutos .- respondeu-me.
- Posso ir vê-lo?

A minha cabeça já estava a doer de tanto falarem para mim e me perguntarem coisas que eu não sabia.
-Sabe o ano em que estamos - neguei - o nome do seu pai - voltei a negar - a tua idade - a médica suspirou e arrumou os papeis dela. - Teve envolvido num acidente de carro, não encontrámos nenhum documento por isso não conseguimos contactar os seus pais. Lamentamos muito. - juntei as sobrancelhas olhando para a porta.
-Então, alguém vai ter que lhe dar um nome enquanto a memória não volta - disse uma rapariga à entrada com as mãos na cintura.

Eu não era uma paciente fácil de aturar e acho que, nestes três dias a enfermeira já se tinha apercebido disso, tanto que me deixou ir vê-lo, tal como lhe pedi. Aceitei apenas a sua ajuda para sair da cama e me sentar na cadeira de rodas e depois de lhe perguntar qual era o número do seu quarto, segui sozinha até ao mesmo. Fiz uma careta de dor, por causa das minhas costelas e vasculhei os corredores até o encontrar, não precisando de bater à porta, visto que estava aberta e o quarto estava cheio de enfermeiras.
- É familiar? - perguntou-me uma delas assim que lá cheguei. Levantei uma sobrancelha, abanando a cabeça e avancei até à cama, esticando a cabeça até conseguir olhar para ele. Só lhe queria ver a cara, ou pelo menos, era isso que eu achava que ia fazer até o olhar. Estava com um péssimo aspecto.- tens noção de que nos podias ter morto aos dois? - olhei-o.- tenho vontade de te meter essa cara ainda mais feia do que já está.

Voltei a desviar o olhar para a porta quando ouvi alguém falar para uma rapariga que estava entrar no meu quarto. Observei a sua perna e, apesar de tentar, não consegui sentar-me, por isso, permaneci deitado. Juntei as sobrancelhas com as coisas que disse mas percebi que o melhor era pedir desculpa.
-Desculpa - disse num tom um bocado duvidoso. - eu não sei do que é que estás a falar. - observei-a atentamente, estava zangada, furiosa. - Eu conheço-te?

Quando ele teve a lata de me dizer que não sabia do que é que eu estava a falar, ambas as minhas sobrancelhas se juntaram enquanto eu olhava para ele com uma expressão incrédula.
- Tu só podes estar a gozar comigo. -disse entre dentes.- tenho uma perna partida e duas costelas igualmente partidas por tua causa e tu dizes-me que não sabes do que é que eu estou a falar? - esforcei-me por não parecer histérica e abanei a cabeça à sua última pergunta.- não, não me conheces.- disse.- sou a Stella, a rapariga que tu quase mataste.- estiquei uma mão na sua direcção, irónica.- prazer.

Arregalei os olhos quando ela ficou ainda mais furiosa depois de eu ter pedido desculpas e olhei para os médicos que agarraram na cadeira dela para a tirar dali, mas não o fizeram logo.
-Tenha calma Stella, ele não se lembra de nada. - disse a enfermeira que tinha dito que precisava de um nome - nem do próprio nome. - parecia que tinha acabado de nascer agora. Olhei em volta e suspirei, coisa que me provocou uma dor enorme no peito e me fez fazer uma careta.
-Tenho a certeza que não foi por mal - disse quando a dor passou e decidi falar.

- Larguem-me.- queixei-me assim que as enfermeiras vieram agarrar minha cadeira, como se eu fosse uma maluca.- eu não lhe vou fazer mal, apesar de vontade não me faltar.- resmunguei e quando a enfermeira me disse que ele não se lembrava de nada, nem do próprio nome, eu não consegui não me espantar, mas não deixei que isso mudasse a forma como me estava a sentir em relação.- se estavam à espera de que eu tivesse pena, lamento, mas não resultou.- disse com um sorriso falso e voltei a olhar para ele.- se foi por mal ou não, não me interessa.- não gritei visto que já tinha dores que chegassem.- a culpa não deixa de ser tua.- atirei-lhe e virei costas, saindo dali sem precisar dos médicos para nada.

-Mas ele... - fiquei a olhar para a enfermeira que me tentava defender mas ela já tinha ido embora. Engoli em seco e olhei para as minhas mãos que brincavam uma com as outras. - Não te preocupes, estão os dois bem - disse ela levantando-me um pouco a cama para ficar inclinado. Encostei a cabeça à almofada e desviei o olhar para a janela
*uma semana depois*
Tinham-me dado o nome de Pyke. Alguns diziam que era nome de cão, eu pessoalmente, não gostava. Pelo menos já me deixavam ir dar umas voltas pelo corredor do hospital. Nos primeiros dias fizeram-me testes, tinha uma perna partida, assim como umas costelas e a clavicula tinha-se deslocado. Havia outras fraturas, mas essas agora já não me doíam. Fui ter até à sala onde os pequeninos brincavam e agarrei num cubo com cores diferentes ficando a olhar para aqui sem saber o que era suposto fazer.

Já tinha passado uma semana e eu continuava ali, enfiada nas quatro paredes daquele hospital. Era horrível, agora conseguia compreender o porquê de muitas pessoas odiarem os hospitais, além de deprimentes, quando se estava ali, o tempo demorava o triplo a passar. Acabei por me levantar com um suspiro, quando me fartei de estar deitada e sentei-me na cadeira, colocando a minha perna sobre a parte elevada da mesma, visto que continuava com o gesso. Hoje não me estava a sentir muito bem, isto de passar os dias ali dava-me muito tempo para pensar, aliás, demasiado tempo. Saí do quarto, vagueando pelos corredores e a minha cadeira parou, sem que eu tivesse noção, quando o meu olhar se fixou na sala de brinquedos das crianças, das crianças pequeninas, tal como Rebecca.